domingo, 12 de abril de 2009

O Paciente

Durante aquele sonho perturbador, Matheus se assustava mais em cada quadra que deixava para trás. Depois de muito tempo sem ver qualquer outro carro andando ou mesmo estacionado, começou a se acostumar com a velocidade, Ele via apenas semáforos parados na última bolinha da fileira de cor verde, indicando que poderia seguir.

É claro que acordou após o despertador tocar mas mesmo assim acordara com medo achando por um segundo que aquele barulho repentino seria finalmente um carro que tivera passado também pela mesma situação dos sinais parados e se acostumara com o trânsito calado, fazendo assim com que os dois batessem de frente e morressem. Uma vez alguém me disse que acordar com medo dava dor de cabeça mas tenho certeza que não foi Matheus.

Matheus nunca dizia uma frase sequer que não tivesse sentido. Ele chegou a se proibir de cantar Novos Baianos por mais que amasse. Nós colocavamos bem alto, principalmente quando ele resolvia tomar banho, pra ver se ele parava com as besteiras mas ele saia do banho encharcado e molhava todo o chão da nossa casa, só pra desligar o som. Daí a gente resolveu parar por causa do cachorro que entrava sujo e pisava na água e virava tudo numa meleca só.

Bom, voltando ao começo da conversa, ele havia acordado, não é? Ligou para psicóloga, que a mãe pagava pro marmanjo, e falou sobre aquele sonho com o intuito de descobrir o significado. A psicóloga logo pediu um tempo para que pesquisasse sobre esse determinado significado que não se lembrava. Na verdade, ela queria tempo para construir uma história em cima daquele sonho e ter idéias maravilhosas para que finalmente ele entendesse que deveria avançar o sinal.

Há 11 meses atrás Matheus começara a consultá-la com frequência. Aproximadamente 3 vezes por semana. Aproximadamente porque ele ligava todos os dias pra ela e com o passar do tempo as ligações se tornaram mais duradouras. Sem nenhuma resposta ou sinal, esteve apaixonado por Samantha durante anos e anos, até tentar suícido não achava nada estranho. Resolveu atender aos pedidos da mãe e procurou ajuda. Na verdade, 9 meses atrás ele nunca havia trocado muitas palavras com Sam.

A psicóloga achava que ele só se livraria da obssessão quando conseguisse ter ela em mãos. Portanto inventou histórias para que ele se aproximasse da menina, bem mais nova do que ele. Finalmente, após anos e anos, Matheus alcançou os lábios vermelhos de sua amada. Me lembro das descrições perfeccionistas dele sobre seus beijos de 10 segundos que gastavamos ouvindo durante, no mínimo, 10 minutos. Isso pra ele já era mais do que ele e nós mesmos não acreditavamos que iria conseguir. Talvez até a psicóloga não botasse muita fé nisso.

Bom, já se passaram 9 meses do primeiro beijo e foi praticamente absurdo pra nossa cabeça depois de tanto tempo ouvir sobre os carinhos no pescoço que ela deu nele. A guria passou a conviver com a gente e nós percebiamos uma certa irritação e um lance estranho de olhares pra outras pessoas. Nós diziamos que era uma biscate, lógico que não na frente dele. Mas descobrimos enfim que a adolescente com os hormônios explodindo tinha razões para largar nosso amigo e, aleluia, conseguir um cara que... ahm, ahm, ou melhor, nham nham.

Deu dó da menina quando nós começamos a brincar sobre fazer sexo à três e ela falou pra ele que ela tinha vontade. Imagina só perder a virgindade com duas pessoas na cama. Ela nem gostava dele, não sei porque pra variar saia com uma galera mais descolada, que ouvisse música eletrônica. Quando ela começou a vir, não conhecia nada das nossas bandas preferidas, mas aposto que hoje já sabe todas decor, mesmo que tenha vergonha de cantarolar um pedaçinho ou outro.

Sílvia ligou atrás dele dizendo que havia entendido o sonho, acredita? Ela começou a ligar na nossa casa e dizer alguns detalhes sobre as consultas e tal. Ele não se importava, dizia todo dia para ela. Nós sabiamos de tudo sobre ele. O que não era tanto assim. Eu dei o recado assim que o vagabundo acordou e ele saiu correndo retornar a ligação.

- E aí? Que bom que você ligou, tava morrendo de curiosidade.
- Você quer vir hoje pra eu te dizer?
- Fala por aqui, eu pago a ligação.
- Ok. Olha, os sinais verdes todos abertos, imploram pra que você o mais rápido possível, tente qualquer coisa, sabe? Avançar o sinal com a Samantha... Ela tem 16 anos, é normal que esteja esperando ter alguma relação com o namoradinho de 9 meses.

Ele desligou o telefone sem dizer nada e discou o único número que sabia de cabeça, além do da Sílvia e o da mãe. Samantha não atendia. Por horas não atendera o telefone. Cheguei a me preocupar. Não com ela, é claro, mas com ele que parecia estar tendo um ataque.

Nós nos conheciamos desde criança. Por isso não havia muito espaço e respeito. Ele dormia, normalmente, fora da nossa casa, uma vez por semana. Carência. Eu amava ele. Tadinho. O que era mais estranho pra nós era que nosso amigo sempre teve habitos meio que, digamos, homossexuais. Depois de Sam ele parou com tudo. Não era mais camisa velha. Camisa velha que o botão abre fácil, sabe? Então... ele se apaixonou loucamente por ela e ficou doido. Até então nenhuma mulher se aproximara dele. Aliás, será que ela sabe disso?

Ela retornou a ligação lá por meia-noite à cobrar. Aquele dia tudo desandou. Não no sentido da sexualidade dele, mas em outros que não tem como nomear.


- Então, tô com sono, são 2:15 da manhã. Eu volto daqui um tempo e termino a história. Enquanto isso eles se falam no telefone. Vai dar uma conta brava esse mês. Até logo, Sr. ou Sra. Ninguém Que Lê Meu Blog. :D

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