sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Eternamente, Iolanda.

Minha avó tem o dom da vida, imprescindível para sorrir e fazer sorrir. E hoje me inspiro nela para dar valor às coisas simples, que faz dela o ser humano pelo qual sinto maior orgulho. Dar valor às coisas simples só pode ser um dom maravilhoso, e quando penso em minha avó é de todas essas pequenas coisas que a fazem tão simplesmente alegre que me lembro e guardo com carinho imenso. Nada mais gostoso do que chegar todo dia em sua casa e ouvir "chegou minha netinha!" antes da refeição inigualável que virá, feita com tanta dedicação e amor. É incrível ver como as pitadas de amor que vem em cada garfada são insubstituíveis. Eu adoro a ouvir cantar aqueles sambinhas antigos, cantigas de carnaval. As pessoas querem mais do que precisam e não se satisfazem, não estou fora da lista, mas minha avó aprendeu com a vida a sorrir pra o que pra muitos seria comum, e talvez só assim se pode ser contente e iluminar e unir a família todo dia como ela consegue fazer. Minha avó é um ser autêntico, e vejo amor em tudo o que ela faz, por isso a amo, e sei que ela merece sempre o pedaço do bolo com o morango em cima. Mulher forte e simples, minha avó, um ser inigualavelmente lindo. À desejo música, e vida, porque amor ela já tem de sobra! Te amo, Iolanda! - 19 de julho. Aniversário de 71 anos da mulher mais linda que conheci, minha avózinha.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

A mente

A mente não deve ser modificada pelo tempo e pelo lugar.
A mente é o seu próprio lugar, e dentro de si
Pode fazer um inferno do céu, do céu um inferno.

Trecho de Paraíso Perdido de John Milton.

sábado, 18 de agosto de 2012

Noite

As estrelas começaram a sentir falta de serem espiadas, enquanto uma nuvem tentava dominar o infinito. Mas a formosa lua ainda nos confortava. Ameaçava cair sobre as nossas cabeças, pendendo no céu, cansada. Não importava, nós não nos poupavamos de adimirá-la quase toda noite. Às vezes a hora de voltar parecia prolongada, e quando vinha iluminava poucos. As luzes das casas demoravam a apagar, mas ali por volta da meia-noite, era como se um vento forte viesse correndo pelas escadas de Coimbra, e a inundasse de escuridão. A cidade abrigava à todos. Ali pelas ruas só restava quem queria estar. Nossos olhos brilhavam. Era tempo de sentir o mundo, e o Vinho do Porto que compramos em Douro duas semanas atrás. O silêncio era gostoso como entrada.
- Essa tentativa de uma perfeição linguística deles me irrita, sabe? Pra mim a língua reflete na personalidade da pessoa, e a personalidade da pessoa se reflete na língua, mas eles quase conseguem montar as mesmas frases perfeitas.
- Parece que estão lendo todos o mesmo livro, e chegaram a decorar palavra por palavra. Uma coisa meio robótica, sem sal, e sem açucar.
- Ou uma coisa, ou outra: a gramática, ou algum parnasiano insuportável.
- Eles tão é imitando as dores de cabeça do João Cabral!
- Hahaha... Sinto falta de Vinicius.
Um moço de boina xadrex, calça e camisa social desabotoada até perto do umbigo, provavelmente estudante de direito, vinha em nossa direção, mas parou antes que chegasse até nós. Estendeu um pano colorido no chão, e sentou-se acompanhado de um violão calado, e uns quantos cigarros soltos.
- Minha salvação!
- O que? Vai pedir o violão emprestado pro cara?
- Não. Uns cigarros. Mas vou esperar um pouco.
Depois de alguns minutos com os olhos de quem pede fixos nos meus, saiu se arrastando. Tomei um gole, outro... encostei minha cabeça na mochila, pensei que queria ir pra lua um dia. Foi aí que percebi que estava bêbada, me virei procurando por ele. Olhei a lua de novo, nos imaginei flutuando lá, mas as cordas que agora vibravam, me dividiram a atenção. "and all I have to do is think of her..." Doavamos o silêncio aos outros, e à noite, era o vento quem guiava.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Braços Inefáveis

Capaz de me confundir os braços com as pernas, capaz de me confortar tamanha confusão, capaz de ser íntima e inconfundivelmente feito pra mim, capaz de me deixar seduzir a ponto de esquecer a vida ali fora, capaz de me fazer inteira presente, capaz de almejar as delícias de não querer a razão, capaz de calar, capaz de só sentir, capaz de matar a sede, capaz de maltratar a saudade, capaz de sonhar sua infinitude, capaz de acordar infinito, capaz de viver, ver morrer, e ressuscitar o amor.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

O que será (à flor da pele)

O que será que me dá Que me bole por dentro, será que me dá Que brota à flor da pele, será que me dá E que me sobe às faces e me faz corar E que me salta aos olhos a me atraiçoar E que me aperta o peito e me faz confessar O que não tem mais jeito de dissimular E que nem é direito ninguém recusar E que me faz mendigo, me faz implorar O que não tem medida, nem nunca terá O que não tem remédio, nem nunca terá O que não tem receita O que será que será Que dá dentro da gente e que não devia Que desacata a gente, que é revelia Que é feito uma aguardente que não sacia Que é feito estar doente de uma folia Que nem dez mandamentos vão conciliar Nem todos os ungüentos vão aliviar Nem todos os quebrantos, toda alquimia Que nem todos os santos, será que será O que não tem descanso, nem nunca terá O que não tem cansaço, nem nunca terá O que não tem limite O que será que me dá Que me queima por dentro, será que me dá Que me perturba o sono, será que me dá Que todos os ardores me vêm atiçar Que todos os tremores me vêm agitar E todos os suores me vêm encharcar E todos os meus nervos estão a rogar E todos os meus órgãos estão a clamar E uma aflição medonha me faz suplicar O que não tem vergonha, nem nunca terá O que não tem governo, nem nunca terá O que não tem juízo
Chico Buarque

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Vamos andando...

A alienação impera em padrões estabelecidos do que deve ser uma mulher. Claro que o homem também não está fora das imposições da sociedade, inclusive a machista, mas a história não nos deixa negar que a condição da mulher fora e ainda é, infelizmente, muito menos liberta do que a de ser homem.
Freud fora mal interpretado quando falou sobre o "complexo de castração" ou "inveja do pênis". Não era o que ele achava que a mulher deveria sentir, e sim o que algumas das mulheres que analisou demonstravam sentir. Não posso deixar de lado o maior estudioso da mente humana já existente, quando compreendo que esses padrões são estabelecidos e criados pela mente humana. Este órgão sexual representa a mais visível diferença entre os dois, um o possui, a outra não, e os pensamentos que acabam por deixar a mulher numa posição abaixo da que o homem exerce na sociedade, foram obviamente criados por eles. Portanto, o pênis se torna símbolo de poder, da qual a situação de inferioridade da mulher a fez alguma vez invejar.
Com isso, pode-se começar a compreender o feminismo. Hoje temos uma repartição neste campo, aquelas que são "femistas", ou seja, aquelas que acreditam que a mulher é melhor do que o homem, que deveriam trocar de lugar. E a "feminista" que acredita que a mulher é tão capaz quanto o homem em todos os âmbitos, e pretende alcançar uma igualdade real, sem que seja necessária uma dominação por qualquer uma das partes.
O despertar desse texto em mim, foi quando ouvi a conversa de um velho e uma mocinha concordando "as mulheres deveriam parar com essa história de feminismo, e se preocupar com a feminilidade que está sendo esquecida."
Gostaria imensamente de ter o livro "O Segundo Sexo" em mãos agora para poder resumir citando algumas linhas que Simone de Beauvoir, tão perfeitamente descrevera o pensamento alienado. Assim prevejo que terei que me prolongar um pouco mais. O que tenho na ponta da língua é: "Não se nasce mulher. Torna-se mulher."
Aprendemos com a sociedade a postura necessária para se tornar uma mulher. Caso uma mulher se ache mais bonita fora dos saltos, caso uma mulher se ache mais atraente fora da acadêmia ou da cirurgia plástica, caso uma mulher se sinta mais confortável de cabelos curtos, ela não estará exercendo a sua função de padronizar a beleza, sua função de ser um pedaço de carne enfeitada.
Um dia desses, discutíamos besteiras em sala de aula, quando a professora doutoura fez uma observação: "Percebam como temos poucas professoras bem sucedidas profissionalmente e casadas. Porque vocês acham que isso acontece? O homem não gosta de mulher mais poderosa do que ele. Vocês tem que ver o que é prioridade para vocês."
Quer dizer que tenho que escolher entre um sucesso ou outro? Quer dizer que as mulheres solteiras não podem ser tão felizes quanto as casadas? Quer dizer que nenhum dos casos foi por escolha da própria pessoa, e sim por um ser que tem a confiança arrasada porque uma mulher, ó ser tão inferior, conseguiu um salário melhor do que o dele? Quer dizer que devo entender que o homem pensa que devo ser inferior a ele, para que ele me ame? Quer dizer que devo amar alguém que me acha inferior ao ser que amo?
O passado serve para nos ajudar a termos mais rebolado pro futuro, mas o passado ficou no passado, e a igualdade é o que buscamos, não queremos baixar a cabeça deles, e sim nos olharmos frente à frente, como qualquer ser humano tem direito.
Relações de dominação existem, mas nem por isso devemos contemplá-las como se fossem as melhores, esquecendo que temos a capacidade de racionalização, por isso podemos transferir esse "instinto de dominação" para dominação das nossas próprias ideologias, e não aceitarmos condições que nos colocam inferiores, nem de querermos inferiorizar o outro. Somos todos iguais? O discurso contrário seria abominável prum mundo que hoje discute tanto a necessidade do respeito entre as diferenças. Somos todos e todas tão capazes e merecedores quanto. Não é apenas o homem e a mulher que são diferentes, são todos os seres humanos, com objetivos, e felicidades diferentes. É nítido que o discurso da igualdade continua atrasado apenas teorizando. Claro que isso não se restringe às mulheres, mas à toda camada inferiorizada da sociedade.
Respeito é essencial, e não preciso citar aqui os inúmeros desrespeitos que mulheres sofrem pelo mundo à fora. Só de passear na rua com o shorts menor do que de costume, ouvimos frases que na maior parte das vezes não queremos ouvir, e ficamos constrangidas, mesmo não tendo feito nada. Bom, o machismo está no dia-a-dia, escancarado, mas tão cravado no íntimo da cultura que já nem se percebe mais sua presença, e pesar de existir. Passa da hora de botar a história pra andar.